Por Hermes C. Fernandes
Quem nunca foi
tomado por um forte sentimento de culpa? Quem jamais desejou voltar no tempo
para consertar as coisas? Mesmo Judas, o apóstolo traidor, sentiu-se
profundamente arrependido do que fizera ao seu Mestre. Lembro-me de quando me
emprestaram um livro chamado “Eu, Judas”, onde o autor tentava redimir a figura
do apóstolo traidor. Entre suas teorias, talvez a mais contundente era a que
dizia que Judas fora movido por um propósito altruísta. Ele achava que se “cutucasse
a onça com vara curta”, Jesus se levantaria, assumindo Seu papel messiânico, arregimentando
Seu povo para uma tomada de poder. A traição seria apenas um empurrãozinho. Mas
as coisas não aconteceram como planejadas.
Quando Judas ouviu
de Jesus que os discípulos deveriam se armar para acompanhá-lo até o Getsêmane,
ele imaginou que finalmente a revolução ocorreria. Porém, Jesus jogou um balde de d’água fria em seus
planos quando não apenas reprovou a atitude violenta de Pedro ao desembainhar
sua espada para defendê-lo, como também colocou no lugar a orelha decepada de
um dos soldados do Sinédrio que vieram prendê-lo.
Amargurado com os
rumos dos últimos acontecimentos, Judas dirigiu-se aos principais sacerdotes e
anciãos para devolver-lhes o dinheiro que recebera para trair seu Senhor. Tudo
deu errado! Jesus fora condenado, preso, e em mais algumas horas seria
crucificado. A conclusão a que Judas chegara foi expressa na frase: “Pequei, traindo o sangue inocente”. Já
que não dava pra voltar atrás, pelo menos o dinheiro que recebera deveria ser
devolvido. Mas para sua surpresa, os sacerdotes recusaram recebê-lo de volta. E olha que trinta moedas de prata eram uma
quantia considerável. Como os sacerdotes
recusaram-se a recebê-la, Judas atirou-a para dentro do santuário e retirou-se
já resolvido a suicidar-se.
Que destino deveriam
tomar aquelas moedas?
Por mais sórdidos
que fossem aqueles sacerdotes, ainda lhes restara certo senso de ética. Em
conselho convocado de última hora, concluíram: “Não é lícito metê-las no cofre das ofertas, porque é preço de sangue.”
Como alguém que foi
capaz de subornar um dos apóstolos de Jesus para traí-lo, ainda seria capaz de
posicionar-se eticamente? Por incrível que pareça, tal senso ético não tem sido
facilmente encontrado em muitas lideranças cristãs. Ouvem-se rumores de líderes
que aceitaram dinheiro do tráfico para financiar a construção de seus templos
ou a aquisição de canais de TV. Soube do caso de uma igreja que apoiou a
candidatura de um governador, e que após as eleições bem-sucedidas, veio
cobrar-lhe uma secretaria, como havia sido prometido. O governador alegou que
todas as secretarias já estavam ocupadas, e que só sobrara a Loteria do Estado
(achando que certamente a igreja não aceitaria). Para a surpresa do governador
(evangélico, diga-se de passagem), os dirigentes da igreja aceitaram de bom
grado a direção do jogo no Estado. Imagine: como uma igreja poderia pregar contra
o jogo, se ela mesma é quem está à frente dele?
A conclusão a que
chego é que os principais sacerdotes que condenaram Jesus eram mais
éticos que
muitos líderes evangélicos de nosso tempo. Que vergonha! Quantos
ministérios edificados sobre "Campos de Sangue"? Quantas ofertas
recebidas que foram fruto de extorsão, venda de drogas, vidas
arruinadas, dinheiro público desviado que deveria ser usado na compra de
ambulâncias, merenda escolar, segurança, etc.?
Como eu poderia
subir ao púlpito com a consciência tranquila sabendo que o dinheiro que
mantém
meu ministério vem de fontes erradas? Como eu poderia pregar honestidade
vendendo os votos do meu rebanho para um político inescrupuloso? Será
que os
fins justificam os meios? Será que Maquiavel tinha razão? Já que não
somos
católicos romanos, em vez de canonizá-lo, que tal elegê-lo como patrono
de
nossa causa? Há que se ter redobrados cuidados com ministérios que
explodem de uma hora pra outra, comprando tudo que vê pela frente...
Quem trabalha duro à frente de um ministério sabe que dinheiro não cai
do céu...
Já que aquele
dinheiro sujo não deveria ser depositado no cofre do templo, algo precisaria
ser feito. Alguém teve uma “brilhante” ideia: Vamos utilizá-lo na aquisição de
um campo para servir de cemitério para os estrangeiros. O conselho prontamente votou e aceitou.
O dinheiro foi
considerado tão sujo, que mesmo que fosse usado na construção de um cemitério,
este deveria ser destinado unicamente aos estrangeiros. Nenhum judeu poderia
ser enterrado nele. A propriedade adquirida recebeu o nome de “Campo de Sangue”.
Interessante notar
que o relato feito por Lucas difere um pouco de Mateus, que é o
que temos considerado até agora. Segundo Lucas em seu relatório conhecido como
Livro de Atos dos Apóstolos, o próprio Judas teria adquirido aquele campo com o
“salário da sua iniquidade”.
Não creio que haja
contradição entre Mateus e Lucas. O fato é que Lucas intencionalmente atribuiu
a Judas a compra daquele campo para enfatizar o seu terrível destino. Como que
por coincidência, Judas sai em busca de um lugar ermo para dar cabo de sua vida,
avista uma árvore à beira de um precipício, pendura-se nela, com o peso do seu
corpo, o galho se quebra, e ele se precipita no abismo, tendo suas entranhas
espalhadas pelo campo. Era uma imagem horrível de ser ver. O que ele jamais
poderia supor é que aquele lugar escolhido para ser cenário de seu suicídio era
justamente o campo comprado com dinheiro que recebera pela traição.
Judas bem que tentou
livrar-se daquelas moedas, mas elas o perseguiram até o fim.
Em contraste com
Jeremias, que mesmo preso adquiriu, por ordem do Senhor, um campo em Anatote
(que quer dizer “Resposta à oração”), o campo adquirido com o dinheiro da
traição foi chamado de Acéldama, que significa “Campo de Sangue”.
Acéldama representa
o fim da linha, o precipício do qual a alma humana se lança quando trai a si
mesma. Toda traição é auto-traição. Ninguém trai alguém se trair a si mesmo. E
toda a traição tem um salário e um custo. O custo jamais compensa o salário que
se recebe dela. E não adianta tentar
fugir, lançar as moedas de volta ao seu lugar de origem. Elas nos acharão!
O precipício é o
preço da precipitação. Precipitamo-nos sempre que sacrificamos nossos princípios e
valores no altar do imediatismo. Traímos
nossas convicções por conveniência. Somos iludidos pela ideia de que é possível
apressar o processo.
Um dia o que estava oculto vem à tona. As entranhas de Judas são
expostas. E aí... será tarde demais.
Fonte: http://www.hermesfernandes.com/2012/09/o-fim-da-linha-para-ministerios.html
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