Algumas
vezes, ouço alguém questionar o amor de Deus. Se para mim o amor de Deus parece
óbvio deve ser porque em minha caminhada de vida – desde a infância até os meus
dias atuais – sempre estive cercado de amor. Tive uma mãe e um pai amorosos,
tias que devotaram carinho, amor e atenção e, irmãos e irmãs, sobrinhos e
sobrinhas que cresceram comigo em um clima de fraternidade, afeto e amor.
Reconheço,
no entanto, que há muitos que não experimentaram esse grau de amor, cumplicidade
e fraternidade em suas vidas, bem como o fato de que estar cercado de amor não
nos impede de errar e tomar certos caminhos que parecem bons, mas que conduzem
a morte e ao engano. Ser cercado desse tipo de amor não impede de que possamos
nos envolver em drogas, prostituição, bebedeiras e em outras formas de
sentir-se livre quando se está aprisionado.
E
nessas prisões que estamos inseridos a nossa visão se turva e não conseguimos
enxergar ou compreender o amor de Deus. Alguns me dizem: “Deus mandou dizimar
povos inteiros e matar crianças e animais, que amor é esse?”. Outros, como um
comediante ateu norte-americano, acredita que Deus é um manipulador. Para alguns,
Deus é uma ideia! E há outros que fazem de Deus um incômodo, afirmam que Ele
não existe, mas vive remoendo e atacando a igreja arguindo que é uma força
opressora, sem enxergar que a sua própria maneira de agir com violência
verborrágica é ainda mais opressora. São muitas imagens que o homem construiu
para o Deus que escolheu não ser representado por nenhuma delas.
Para
eles é difícil compreender o amor de Deus. Deus não é um facínora, nem um
genocida, Deus é simplesmente Deus. Dentre os seus muitos atributos, nós o
entendemos como justo e como santo. Pois bem, em sua santidade, Deus não se
obriga para como nenhum de nós e quando o faz, decide assim fazê-lo em amor.
Decide fazê-lo demonstrando o seu amor por aqueles a quem escolheu. Mas essa
escolha não é injusta!?!? Se você me apontar um ser humano que não tenha
defeitos, que não seja capaz de fazer o mal, que nunca tenha se corrompido com
seus próprios prazeres, certamente te diria que Deus é injusto! Mas se não
existe tal pessoa, Deus é justo e, assim sendo, está acima de nossa natureza
transgressora e decadente.
Em
verdade, sou tentado a afirmar que o mundo de hoje está tão carente, tão vazio
de amor que se tornou incapaz de compreender o amor de Deus. Estamos tão
cercado de atrocidades, de crimes inacreditáveis, da banalização da vida, dos
sentimentos, da família, da beleza, da moralidade. Essa geração é uma geração
estética, que aprecia mais a superfície que a profundidade, que proclama o carpe diem e não o projet de la vie (de Jean-Paul Sartre). Não pensamos no amanhã, mas
apenas no agora, no imediato. Queremos viver tudo de uma só vez, ao invés de
planejarmos viver uma vida inteira. Como afirmou Renato Russo, somos a geração
do “o pra sempre sempre acaba”.
Não
se pode pedir a um mundo imerso na violência, na impunidade, nas mais diversas
formas de corrupção que compreenda o sublime amor de Deus.
“E, por se
multiplicar a iniquidade, o amor de muitos esfriará.” (Mateus 24;12), muitos já esfriaram e, com
isso, perderam a fé. Acusam Deus de ser indiferente por permitir tais
atrocidades e concluem, sem a solidez da argumentação científica, que por essa
razão Deus não existe. É mais fácil ignorar as próprias culpas e encontrar um
bode expiatório. Mas como nos permite concluir, a partir das leituras do
polonês Zigmunt Bauman, somos uma geração de imediatistas, de uma crítica desdentada,
incapaz de tomar uma atitude para transformar a realidade social pela qual
todos somos responsáveis. Entretanto, como cobrar daqueles que se escondem por
trás de uma imagem de inteligentes, intelectuais, mas esbarram que é mais
correto encher a cara, fumar um baseado e se afirmam mais livres que aqueles que
buscam em Deus a sua satisfação e liberdade? Quem está a enganar quem?
Procuramos em Deus o amor que nos liberta e aqueles que
realmente mergulham com intensidade nesta busca é verdadeiramente livre. Não me
refiro aos que mergulham na institucionalização, na religiosidade, no
formalismo, no dualismo ignorante e sectário pautado no dualismo pode/não pode.
Deus não tem nada com isso! Deus é gracioso e a graça é a expressão maior de
Seu amor e foi manifesta na ousadia e extremismo da crucificação.
Culturalmente, a cruz no século I era a pior humilhação a que
um homem poderia ser submetido, mas Deus não poupou a si mesmo ao entregar Seu
único filho e lançar sobre toda a ira reservada para nós que somos falhos,
pecadores e merecedores de Sua ira. Jesus foi humilhado, torturado e morto por
uma culpa que não tinha, condenado por um pecado que era meu e seu. Ele é nosso
redentor, nosso salvador, nosso libertador.
A redenção é o pagamento feito para libertação de um escravo.
Na antiguidade, quando alguém era tomado por escravo, poderia livrar-se de sua
condição se um parente pagasse a sua dívida. Esse parente ou benfeitor era
conhecido como resgatador ou redentor. Tomando por referência o
direito romano, sabemos que o escravo é res,
é instrumenta vocalia (uma coisa que
fala) e não persona (pessoa), ou
seja, não há como o escravo que é uma coisa, possa voltar a ser pessoa. Por isso,
o redentor comprava o escravo para um deus, o que significa que a sua liberdade
era sinônimo de servidão a um determinado deus. Se Jesus é nosso redentor, isso
significa dizer que ele nos resgatou da escravidão do pecado para sermos
escravos do Deus Todo-Poderoso (Romanos 6:18), e não há liberdade real fora
dEle.
A nossa salvação se opera no plano interior, pois somos
salvos de nós mesmos, somos salvos de uma natureza frívola e entregue as
próprias paixões, inflamada e desejosa pelo mal. Nunca vi ninguém morrer de
oração, mas vejo todos os anos muitos morrerem por causa do cigarro. Nunca vi
famílias serem destruídas pelo amor, mas já vi e vejo muitas destruídas pelas
drogas e pelo álcool. Nunca vi acidentes provocados por alguém estava indo ou
voltando para igreja, mas vi e vejo muitos provocados por pessoas embriagadas
voltando de farras e festas. Vemos famílias e pessoas inocentes sendo mortas
pelos erros e pelas inconsequências de uma vida distante da Verdade, mergulhada
na ilusão e na alienação de uma liberdade irresponsável, inconsequente e
imediatista.
As pessoas nunca se sentiram tão livres para amar. O sexo é
coisa fácil. Uma vez perguntaram a um morador de uma cidade no sertão
nordestino se havia por ali algum bordel e o morador respondeu: “Tem mais
não... as ‘menina’ num deixa! Elas tão dando tudo de graça!”. Ninguém preserva mais o seu corpo, pois isso é
retrógado, é caretice! Coisa ultrapassada! E para que muitos não acreditam que
isso não é generalizado, ouço pessoas na igreja pensar do mesmo modo. Se eu
amo, eu quero e se eu quero, eu faço. Não há freios, não há limites. E o que nós
encontramos, pessoas decepcionadas, que algumas vezes se sentem desvalorizadas.
Encontramos pessoas descartáveis, vivendo relacionamentos descartáveis e
proclamando e perpetuando a seus filhos e filhas a irresponsabilidade, a inconsequência,
a ausência de moralidade e ética, e a ideia de que ser livre é fazer o que se
quer, mesmo que isso implique em destruir lares, em destruir seu corpo, em
ferir pessoas, em frustrar expectativas.
É triste constatar que a igreja não está livre de tais
coisas. Há muitos na igreja que não compreendem o amor de Deus. Pessoas que se
tornaram tão religiosas a ponto de se acharem boas. Pessoas que estão tão
feridas que são incapazes de perdoar. Em muitos aspectos são diferentes
daqueles que estão no mundo. Vivem uma religiosidade superficial e moralista,
que enfatiza um conjunto de regras, a perceber ou mergulhar na graça de Deus. Pessoas
que afastam, que destroem as pontes, ao invés de servir como pontes para que as
pessoas atravessem o abismo que as separam do Senhor. Pessoas que pensam o mal
e que em seus corações estão ocultas as paixões e desejos carnais. Pessoas para
quem o profeta falou: “Lava o teu coração da malícia,
ó Jerusalém, para que sejas salva; até quando permanecerão no meio de ti os
pensamentos da tua iniquidade?” (Jeremias 4:14).
Não raro vemos pessoas que
buscam a igreja ou ao Senhor para aliviar as suas tenções e não para mudar as
suas vidas. Se apegam ao conforto que uma boa igreja causa a sua consciência
pesada, mas quer em suas atitudes, quer em seus valores apregoam e se dedicam
as mesmas transgressões. Não mudança sincero, não há entrega, mas tão somente
uma presença vazia, um número a mais, um corpo presente. São os cristãos comedores
de fast food, experimentam, mas não
se saciam. Comem, mas permanecem desnutridos. A. W. Tozer escreveu: “Ninguém
pode ‘experimentar’ Jesus. Ele não está à disposição de ninguém para ser
testado. Cristo não está sob teste. Você está. Eu estou. Ele não!”. Muitos não
compreendem essa verdade e continuam acreditando que estão com Deus, mesmo
quando é apenas Deus quem deseja estar com eles.
Não há cristianismo sem
mudança, sem conhecimento ou sem profundidade. E a ignorância nos faz envergonhar
o evangelho de Cristo e nos faz viver e sofrer a perseguição – que muitos
precipitados acreditam ser um sinal de um caminho certo – pelos nossos desvios
e devaneios que pela verdadeira pregação do Evangelho de Jesus Cristo. A esse
respeito, são contundentes e esclarecedoras as palavras de Nicodemus: “O apóstolo Paulo escreveu aos coríntios que a palavra da
cruz é loucura para a mente carnal e natural, para aqueles que estão perecendo
(1Co 1:18, 21, 23; 2.14; 3.19). Ele mesmo foi chamado de louco por Festo quando
lhe anunciava esta palavra (Atos 26.24). Pouco antes, ao passar por Atenas,
havia sido motivo de escárnio dos filósofos epicureus e estóicos por lhes
anunciar a cruz e a ressurreição (Atos 17:18-32). O Evangelho sempre parecerá
loucura para o homem não regenerado. Todavia, não há de que nos envergonharmos
se formos considerados loucos por anunciar a cruz e a ressurreição. Como Pedro
escreveu, se formos sofrer, que seja por sermos cristãos e não como assassino,
ou ladrão, ou malfeitor, ou como quem se intromete em negócios de outros
(1Pedro 4.15-16). [...]Infelizmente os evangélicos - ou uma parte deles
- não deu ouvidos às palavras de Paulo, de que é válido tentarmos não parecer
loucos. Existe no meio evangélico tanta insensatez, falta de sabedoria,
superstição, coisas ridículas, que acabamos dando aos inimigos de Cristo um pau
para nos baterem. Somos ridicularizados, desprezados, nos tornamos motivo de
escárnio, não por que pregamos a Cristo, e este, crucificado, mas pelas
sandices, tolices, bobagens, todas feitas em nome de Jesus Cristo. [...]
Infelizmente os evangélicos - ou uma parte deles - não deu ouvidos às palavras
de Paulo, de que é válido tentarmos não parecer loucos. Existe no meio
evangélico tanta insensatez, falta de sabedoria, superstição, coisas ridículas,
que acabamos dando aos inimigos de Cristo um pau para nos baterem. Somos
ridicularizados, desprezados, nos tornamos motivo de escárnio, não por que
pregamos a Cristo, e este, crucificado, mas pelas sandices, tolices, bobagens,
todas feitas em nome de Jesus Cristo.”
Talvez
por essa razão, Charles Swindoll escreveu A
Igreja Desviada, exortando a igreja a reencontrar o caminho da Palavra de
Deus. Precisamos de um reforma para assim reformarmos o mundo. Precisamos compreender
as verdades mais básicas do Evangelho, como a graça, o perdão e o amor de Deus.
Mas
mesmo dentro da igreja, muitos não tem se deixado conduzir pelo amor de Deus e
tem deixado de amar o perdido a ponto de conhecer a Palavra de Deus para anuncia-la,
de amar a igreja – não a denominação ou a instituição assim chamada – a ponto
de lutar por ela. Não tem sido grato pela cruz e se entregado totalmente ao Senhor,
mas tem frequentemente aberto concessões que tornam demasiadamente perigosa a
caminhada.
Somos, em muitos momentos, uma
igreja que ilumina caminhos tortuosos, enlameados e inseguros, ao invés de que
indicar, sinalizar e apontar o caminho íngreme, mas seguro ao Trono do Rei dos
Reis. Em Cartas do diabo ao aprendiz,
C. S. Lewis escreveu: “Com efeito, a estrada mais segura para o inferno é
aquela ladeira gradual e suave de chão macio, sem curvas acentuadas, sem marcos
de quilometragem e sem placas de sinalização.” Uma estrada que não indica nada,
que não alerta para os perigos, que não mostra as curvas acentuadas, os desvios
ou a direção a ser tomadas em suas muitas bifurcações, mas parece sempre agradável,
retilínea, rápida e segura.
A igreja precisa acordar da
letargia e despertar para a necessidade que nós e o mundo tem de ser amado e de
viver – não experimentar – o profundo amor de Deus que se materializou no
caminho ao Calvário e que se consolidou na cruz de Cristo. Precisamos ter a
ousadia de orar poderosamente com o apóstolo Paulo: “Por causa disto me ponho de joelhos perante o Pai de nosso Senhor Jesus
Cristo,
Do qual toda a família nos céus e na terra toma o
nome,
Para que, segundo as riquezas da sua glória, vos
conceda que sejais corroborados com poder pelo seu Espírito no homem interior;
Para que Cristo habite pela fé nos vossos
corações; a fim de, estando arraigados e fundados em amor, Poderdes
perfeitamente compreender, com todos os santos, qual seja a largura, e o
comprimento, e a altura, e a profundidade, E conhecer o amor de Cristo,
que excede todo o entendimento, para que sejais cheios de toda a plenitude de
Deus. Ora, àquele que é poderoso para fazer tudo muito mais
abundantemente além daquilo que pedimos ou pensamos, segundo o poder que em nós
opera,
A esse glória na igreja, por Jesus Cristo, em
todas as gerações, para todo o sempre. Amém.” (Efésios 3:14-21).
O meu convite a
você é de refletir sobre quem você é diante de Deus, sobre o que você tem feito
com a sua vocação (a de ser santo) e, acima de tudo e ante de tudo, se você tem
compreendido, abraçado, vivido e transmitido o amor de Deus sobre ti e sobre o mundo
que vos cerca. Mais uma vez afirmo, o mundo está tão carente de amor que se
tornou incapaz de compreender o amor de Cristo. O mundo nos olha e não ver esse
amor, porque muitos ainda têm vivido em suas próprias redomas e para seus
próprios desejos que se esqueceram que o mundo espera e anseia por aqueles que
o amem e que façam diferença em suas vidas. O mundo espera por mim, o mundo
espera por você!
Mamanguape, 12 de novembro de 2012.
Fonte: http://ivandromenezes.blogspot.com.br/
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(2) A única coisa que eu não aceito é vir com a teologia do “não toque no ungido”, que isto é conversa para vendilhão dormir... Faça como os irmãos de Beréia e vá ver se o que lhe foi dito está na Palavra Deus!
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“Mais importante que ser evangélico é ser bíblico” - George Knight .