Briony Leyland
Da BBC News em Erromango
Da BBC News em Erromango
Moradores esperam se livrar de suposta 'maldição' por morte de missionário
O ritual se deu na pequena ilha de Erromango, uma das ilhas que compõem a nação de Vanuatu, onde em 1839 os indígenas mataram e devoraram o reverendo John Williams, um dos mais reconhecidos missionário de seu tempo, e seu colega James Harris.
Desde então os nativos crêem ser vítimas de uma "maldição", que querem desfazer agora que o catolicismo é cada vez mais forte na ilha.
"O povo de Erromango sempre teve sobre si o peso de ter matado um missionário. Eles acham que foram amaldiçoados e é por isso que essa reconciliação é tão importante", disse à BBC o presidente de Vanuatu, Iolo Johnson Abbil.
"Desde que passamos a nos considerar como um país cristão, era necessário que Erromango passasse por isso."
Canibalismo
Em 1816, aos 20 anos de idade, John Williams abraçou a vida de missionário dedicando-se à catequização de indígenas da Polinésia sob os auspícios da Sociedade Missionária de Londres.
Dedicou-se à atividade por mais de duas décadas. Em sua última viagem, ele aportou em 1839 a bordo do navio Camden na baía de Dillons, no arquipélago a mais de 1,5 mil quilômetros a leste da Austrália que ainda viria a se tornar Vanuatu.
Williams abraçou a vida de missionário aos 20 anos por duas décadas
"Harris, que estava mais adiante, foi abatido a clavas e morto. John Williams se virou e tentou correr para o mar. Eles o alcançaram na costa. Ele também foi abatido, flechado e morreu nas águas rasas", contou um dos descendentes do missionário, Charles Milner-Williams, 65.
O antropólogo Ralph Regenvanu, membro do Parlamento de Vanuatu e um dos que propuseram a reconciliação, disse que os homens provavelmente foram mortos porque representavam a "incursão" do homem branco na terra indígena.
"O canibalismo era praticado de forma de ritual e considerada uma atividade sagrada. Muitas vezes era uma maneira de derrotar uma ameaça, de absorver o poder do inimigo", disse o antropólogo.
"John Williams pode ter sido morto e devorado porque representava essa ameaça, essa incursão da civilização europeia que estava chegando a Erromango naquela época."
Reconciliação
Na cerimônia de reconciliação, à qual compareceram 18 descendentes do missionário Williams, a morte dos dois homens foi reencenada. Dezenas de descendentes dos moradores de Erromango à época fizeram fila para pedir o perdão da família.
O canibalismo era muitas vezes uma maneira de derrotar uma ameaça, de absorver o poder do inimigo. John Williams pode ter sido morte e devorado porque representava essa ameaça, essa incursão da civilização européia que estava chegando a Erromango naquela época.Ralph Regenvanu, antropólogo
"A reconciliação é parte da nossa cultura. Pedir perdão é uma parte do cerimonial, mas não a única”, disse Regenvanu. “A reconciliação requer algo de ambos os lados, há sempre o elemento da troca."
A família de Williams concordou em amparar a educação de uma garota de sete anos de idade, que foi ritualmente "entregue" à família como compensação pela perda do missionário.
Para o parente de Williams, Charles, o ritual foi emocionante.
“Vim sem saber o que esperar e saio, curiosamente, com minha fé restaurada e me sentindo renovado", afirmou Milner-Williams, que vive em Hampshire, no sul da Inglaterra.
"Pensei que após 170 anos eu não sentiria nenhuma emoção, mas a pureza dos sentimentos, o arrependimento genuíno e a tristeza, de partir o coração, foram bastante tocantes."
Fonte: BBC
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