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"Se o mundo vos odeia, sabei que, primeiro do que a vós outros, me odiou a mim." – Jo 15.18

2 de março de 2010

Eu tiro o chapéu para o filho de Suzana



Como calvinista convicto, vejo-me como um gafanhoto em terra de gigantes: Agostinho, Calvino, Lutero, Zwinglio, Tyndale, Knox, Bunyan, Hooper, Dering, Greenhan, Perkins, Sibbes, Flavel, Rogers, Baxter, Owen, Spurgeon, Edwards, Lloyd-Jones, Kuiper e Whitefield, para ficar nos mais antigos e não alongar demasiadamente a lista. Porém, o meu grande herói depois dos apóstolos é um arminiano.  E um arminiano militante, diga-se.

Neste mesmo dia, há 219 anos, por volta das 10 horas da manhã, John Wesley partia para  a glória, aos 89 anos de vida e 53 anos de um incansável ministério. Os que presenciaram a partida deste homem, cantaram um hino de louvor a Deus e ajoelharam-se pedindo que o manto de Elias caísse sobre as costas daqueles que ficaram neste mundo.

Por que John Wesley é meu herói favorito? Certamente que seu trabalho no Senhor é admirável. Escreveu mais de 200 livros e montado sobre um cavalo percorria uma distância equivalente a uma volta completa na terra a cada seis anos, pregando cerca de 40.000 sermões, quase nunca menos de dois por dia, às vezes oito ou mais. Aos 86 anos acordava às 5:30h da manhã e seis dias antes de sua morte escreveu uma carta a Wilberforce animando-o na luta contra a escravidão, a coisa "mais vil que já existiu embaixo do sol".

Certamente que John Wesley não se destaca pela sua doutrina, pois não escreveu uma obra sistemática e basicamente expôs suas doutrinas sermões e em algumas cartas. Além disso, teve seus deslizes nesta área, como na controvérsia calvinista que se seguiu à morte de Whitefield. Na conferência de 1770 propôs e teve aprovada uma declaração doutrinária que sugeria a salvação pelas obras. "Aceitamos como máxima que o homem nada precisa fazer para obter a justificação. Nada pode ser mais infundado. Todo aquele que deseja obter o favor de Deus deve apartar-se do mal e aprender a praticar o bem (...) Não é essa a salvação por meio das obras? Não em virtude das obras, mas tendo as obras como uma das condições". 

Diante da reação enérgica dos calvinistas, Wesley e outras pessoas reunidas na conferência seguinte esclareceram que "repudiam a doutrina da salvação pelas obras como perigosa e abominável; e, como parece que essas atas não são bastante claras  em sua forma atual, declara, solemente, na presença de Deus, que não há alguma segurança ou confiança a não ser nos méritos de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo para justificação e santificação, quer na vida, quer na morte, quer no Dia do Juízo". Nada mais nobre do que errar e reconhecer o erro.

Os seus escritos não são obras-primas, seja pelo conteúdo, seja pelo estilo. Embora escrevesse com clareza, faltava-lhe profundidade e brilhantismo, na opinião de seus partidários e amigos mais chegados. Ele era uma mente prática e por isso não alçava vôos mais altos. Como um biógrafo escreveu, "seu espírito parece bem mais disposto às idéias populares, às doutrinas moderadas e aos assuntos do bom senso". Não tinha tempo para ser um autor no sentido técnico da  palavra, mesmo assim, sua obra é de um volume monumental e compreende escritos sobre teologia, biografia, história, filosofia, poesia, gramática e medicina. Só sermões publicados são 140.

Apesar de ser um pregador full-time, Wesley não era um orador tão capaz como seu companheiro George Whitefield. Este era mais veemente, tinha mais eloqüência. Mas a cada um a seu modo, Deus usou para persuadir e salvar almas. A pregação de Wesley era improvisada, algumas vezes longa, chegando a duas e até três horas. Ele não lia os seus sermões, como era a prática naqueles dias. Ele nunca lisongeava seu auditório e jamais disfarçava seus pensamentos para torná-los mais aceitáveis. Era direto, incisivo e seus olhos eram fixos nos de seus ouvintes.

A grandeza de John Wesley não deve ser buscada, portanto, em seu trabalho, sua teologia ou seus sermões, embora ele tenha feito muito, mas na sua vida pessoal, que pode ser resumida numa palavra: piedade. Ele foi um grande reformador porque foi um grande cristão. Ele vivia o que pregava. Comparado com Lutero, diz-se que este tinha mais gênio, mais imaginação, mais audácia e mais outras qualidade que o colocavam acima dos outros homens, mas Wesley era mais puro, mais singelo, mais abnegado, mais irrepreensível. Wesley tinha um amor intenso a Deus e aos homens e isto fazia dele o que ele foi. Sua capacidade de trabalho resultava desse amor.

John Wesley dizia que queria ser homem de um só livro, a Bíblia. Dele disseram que tinha uma só idéia, a salvação dos pecadores. Por isso ele foi quem foi.

Soli Deo Gloria, por John Wesley (1703-1791)


Fonte:  Cinco Solas

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