Antes de falar especificamente sobre a Expocristã, uma exposição realizada todos os anos em São Paulo/SP, geralmente no mês de setembro, quero tecer breves considerações sobre a música cristã de nossos dias. Atualmente a música cristã é dividida em duas grandes vertentes: 1) a música sacra, que é a executada nos cultos protestantes históricos principalmente sob a forma de hinos congregacionais e hinos para corais; 2) a música gospel, que hoje atende pelo pomposo nome de "Música Cristã Contemporânea" (MCC). O problema é que a MCC apresenta sérios problemas, os quais a tornam quase idêntica à música popular ou secular, com exceção da maioria de suas letras. Os desvios são os seguintes: a) transformação da MCC em fonte de lucro, integrando-a ao capitalismo musical imposto pelo mercado fonográfico (um exemplo disso é a utilização de termos como "mercado", "produto", "artista", "turnê", entre outros); b) estímulo à tietagem aos músicos do gênero, o que acaba tornando-se uma forma de idolatria; c) exploração demasiada das emoções, em especial nas apresentações ao vivo, com manifestações que variam do transe ou êxtase à histeria; d) uso de músicas impróprias para o cristão fiel, conforme consta no livro "Os perigos traiçoeiros do rock", de Dan D. Johnson, publicado pela Editora Batista Regular em 1988. Será que os ministros de música e os músicos cristãos em formação estão preparados para enfrentarem essa dura realidade, mantendo-se fiéis a Deus e permitindo que o Espírito Santo os dirija apesar das pressões que ameaçam esse ministério tão visado pelo Inimigo de nossas almas? Vejamos o que a Bíblia diz: "Rogo-vos pois, irmãos, pela compaixão de Deus, que apresenteis os vossos corpos como um sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, que é o vosso culto racional. E não vos conformeis a este mundo, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente, para que experimenteis qual seja a boa, agradável, e perfeita vontade de Deus" (Romanos 12:1-2). Pois bem: na tarde de 17/09/2005, logo depois do almoço, viajei para São Paulo com a intenção de assistir uma apresentação da cantora Eyshila na 4ª Expo Cristã, na Expo Center Norte. Quis fazer isso antes que chegassem a minha residência os três CDs que eu comprara pela Internet, todos da cantora citada. Chegando ao Terminal Barra Funda, comprei um bilhete Múltiplo 2 do Metrô e peguei dois trens até o Terminal Tietê. Do Terminal Tietê, tendo em mãos um mapa conseguido na Internet, fui a pé até o Pavilhão Branco da Expo Center Norte e tive dificuldade para passar pela multidão que ia e voltava o tempo todo. Precisei enfrentar uma imensa fila e preencher um cadastro para poder entrar no recinto. Imaginem uma feira como tantas outras que surgem de vez em quando no Anhembi, por exemplo. Foi exatamente isso que eu encontrei. Milhões de reais em material de propaganda, CDs, DVDs, livros, instrumentos musicais, equipamentos de som... Sem falar no colossal aparato logístico e no enorme quadro de pessoal, como as equipes de recepção, segurança, limpeza... Com o mapa oficial da feira em mãos, procurei o local da apresentação da Eyshila, que fora transferido das 17:00 h para as 18:30 h. Fui parar no gigantesco quiosque da MK Publicitá, (hoje MK Music), que tinha até um pavimento superior que lembrava a Estufa do Jardim Botânico de Curitiba. Ao chegar diante do palco, uma adolescente cantava – e muito bem – "Apenas um toque", da Fernanda Brum, como parte do "Show de Calouros" apresentado por uma envelhecida Marina de Oliveira; no telão atrás da moça, a exibição dum DVD com milhares de pessoas assistindo a própria Fernanda Brum chacoalhando no meio dum palco imenso e cantando o mesmo "Apenas um toque". Transcorria ainda o "Show de calouros" quando subiu as escadas do quiosque uma moça parecida com alguém que eu já conheço: era a Eyshila. Mais tarde chegaria, para delírio da platéia que ali se aglomerava, uma moça parecida com a Sula Miranda: era a Aline Barros. O caos era enorme na feira: o reator do telão da MK queimou, a multidão em frente ao palco aumentava, um sujeito num quiosque próximo cantava alto para desespero da Marina de Oliveira... Sim, esta cantou também. E tome Fernanda Brum, e tome "Posso clamar" (duas vezes por calouros e outra pela própria Eyshila logo mais)... No fim, ganhou o "Show de calouros" uma morena que cantara "Apaixonado", da Aline Barros. Enfim, chegou a hora dos pocket shows da M.K.. O primeiro foi com Léa Mendonça, já com seus quarenta-e-lá-vai-pedrada, que cantou somente dois hinos (!!!) e mexeu muito com a platéia, pondo microfones diante de seus fãs para cantarem com ela. E fotos para todo lado... Em seguida, o motivo principal de minha viagem: Eyshila. Já era a terceira vez que eu ouvia os versos "Mestre, o vento balançou meu barco...". E não é preciso dizer que o populacho cantou mais que a sósia duma conhecida minha. Ah, ela cantou também "Terremoto", de seu CD homônimo, que acabara de ser lançado. E só. Em seguida, a sósia da Sula Miranda, vestida de jaqueta e calça brancas, promoveu um frenesi diante do quiosque da M.K.. Falando com vozinha de criança e cantando com vozeirão poderoso (afinal, já eram quase 30 anos de idade e 15 anos de carreira), Aline Barros levou o <a>público</a> ao delírio com três sucessos, inclusive o tal "Apaixonado", já com o filho dela no palco. Findo o espetáculo, Marina de Oliveira tentou controlar o êxtase do povo quando Aline desse seus autógrafos para evitar que a cantora precisasse escapulir pela saída de emergência por causa do tumulto. Analisando as cantoras cujo desempenho pude conhecer, especialmente Fernanda Brum (ainda que apenas pelo telão), Eyshila e Aline Barros, percebi que a maioria dança muito, passa muito a bola para a platéia e quase não faz esforço para cantar, salvo em agudos muito prolongados. O máximo que vi de esforço físico foi a careta de Eyshila, cujas veias jugulares sobressaíam, e a leve vibração de cabeça de Aline Barros. Ao entrar no Cometa das 20:15 h, no Terminal Barra Funda, fiquei ao mesmo tempo feliz por tudo ter saído além do planejado e triste por ter percebido que a música sacra é cada vez mais objeto de lucro, afastando-se progressivamente da exortação divina contida no texto bíblico de Romanos citado acima. * Passaram-se quatro anos. Não tenho mais os CDs da Eyshila, pois eu os colocara em caixas de correspondências durante meus passeios de bicicleta (é assim que eu faço quando não gosto dum CD). Desta vez foi uma tal de Estrangeira, em seu relato publicado em 12/09/2009 e contido no link http://estrangeira.wordpress.com/2009/09/12/um-dia-na-expomamon/ , que resolveu visitar a Expocristã, já em sua oitava edição. Na época estava em evidência a profetada do Pr. Morris Cerullo em benefício do Pr. Silas Malafaia, na qual quem contribuísse com R$ 900,00 receberia a "Bíblia da Vitória Financeira" e teria muitas bênçãos nessa área. Revoltada, a Estrangeira mandou fazer uma camiseta com os dizeres "UNÇÃO FINANCEIRA POR R$ 900,00?" (frente) e "ISSO É PROFETADA – 2 PE 2.1" (verso). Segundo ela, seria "uma espécie de protesto silencioso contra os líderes e igrejas que estão comercializando com o Evangelho". Corajosa, ela vestiu tal camiseta e foi até a Expo Center Norte – o mesmo local de quatro anos antes – sem encontrar as imensas filas dos anos anteriores, talvez porque a maioria do povo já esteja cansada do "claro comércio das coisas de Deus". Ao entrar no recinto, ela fez questão de andar bem devagar por lá para que o maior número possível de pessoas lessem o que estava escrito em sua camiseta. Enquanto alguns a olhavam com um misto de ódio e desprezo, outros pareciam aprovar os dizeres da indumentária, chegando até a puxar assunto com ela sobre a sandice do Pr. Cerullo. Enquanto recebia muitos papéis de propaganda e lembrancinhas, a Estrangeira se surpreendia a cada estande visitado, como o da "Unção Dobrada", do Pr. Marcos Feliciano e do Miss. Ezequiel Pires. Havia até uma "cueca magnetizada" sendo vendida ali! Mas o momento mais bizarro certamente foi quando ela se deparou com uma réplica detalhada da Arca da Aliança, com anjos em cima e tudo, que evidenciava um movimento herético que se tem espalhado epidemicamente pela maioria das denominações neopentecostais: o sacerdotalismo judaizante. Como nas últimas edições, havia também uma grande oferta de cantores e grupos de louvor, emissoras de rádio, acampamentos de aluguel, financiamentos de imóveis de empresas gospel para lá de suspeitos e viagens para Israel, sendo algumas delas com as presenças de Morris Cerullo, alguns integrantes da família Valadão, Benny Hinn (que um vídeo muito assistido no Youtube chama de "Benny Satan Hinn") e o "paipóstolo" Renê Terra Nova. Mas as grandes estrelas da 8ª Expocristã foram Estevam e Sônia Hernandes, recém-saídos da prisão domiciliar nos Estados Unidos e que chegaram à Expo Center Norte dando autógrafos e anunciando a oficialização do Dia da Marcha para Jesus por meio duma lei sancionada pelo presidente Lula. Aliás, o "apóstolo" e a "bispa" pareciam onipresentes no evento por meio de estantes da CIAEB, da Rede Gospel, da Renascer, do Renascer Praise, do óleo ungido Flor de Liz (do bispo Gê), entre outros, o que indicava, segundo as palavras da Estrangeira, que "o dízimo do Kaká está servindo para gastar bastante na tentativa de mudança de imagem". Já editoras sérias como Hagnos, Fonte Editorial e Vida Nova conseguiram marcar presença na exposição somente em mesinhas de 1 m X 1 m, com bandeirolas identificando cada editora. Ou seja, a literatura cristã de qualidade deu lugar às celebridades gospel. Celebridades como RR Soares, que iria ao local depois da passagem da Estrangeira pelo mesmo, também distribuindo autógrafos e divulgando a Igreja Internacional da Graça, a RIT, a Graça Music... Já o Pr. Silas Malafaia não apareceu nem foi representado por sua Editora Central Gospel porque, em seu programa de televisão, o embaixador de Cerullo no Brasil alegara estar na Bienal do Rio, um evento que reunia todo tipo de <a>público</a> (e não somente o evangélico), o que afastava a hipótese de Malafaia ser criticado por aceitar profetadas em troca de dinheiro. Em resumo, possivelmente Malafaia sabia que estava errado, mas não queria admitir isso publicamente e a fuga parecia ser a medida mais cômoda para proteger-se. Ao voltar da 8ª Expocristã, a Estrangeira, no antepenúltimo parágrafo de seu artigo, desabafou: "A Palavra de Deus, salvo poucas exceções, continua a ser deturpada de acordo com os interesses financeiros dos líderes e das denominações, e o povo aprova isso por estar acostumado com relações de troca, de compra e venda, e por isso crêem que Deus também age assim. Contanto que a bênção chegue, não importa se ocorre por conta de R$ 7,00, R$ 900,00 ou um despacho na esquina. Se a bênção vem isso é um bom fruto, então o método é bom. Terrível engano". Que os cristãos fiéis, que não se deixam levar nem pela idolatria aos "astros" e "estrelas" da MCC nem pelo festival de heresias que são difundidos pelas lideranças mais famosas do meio neopentecostal, tenham sempre em mente exortações bíblicas como a seguinte: "Porque nada trouxemos para este mundo, e manifesto é que nada podemos levar dele. Tendo, porém, sustento, e com que nos cobrirmos, estejamos com isso contentes. Mas os que querem ser ricos caem em tentação e em laço, e em muitas concupiscências loucas e nocivas, que submergem os homens na perdição e ruína. Porque o amor do dinheiro é a raiz de toda a espécie de males e nessa cobiça alguns se desviaram da fé, e se traspassaram a si mesmos com muitas dores" (I Timóteo 6:7-10). Amém. |
Escreveu para o blog Web Evangelista o nosso amigo Paulo Martins de Oliveira Belo. (conhecido aqui como SoroKabano).
Na foto que acompanha este artigo, eu apareço de cavanhaque, logo acima da moça de blusa cor-de-rosa. No palco está Aline Barros, que tinha acabado de ser contratada pela MK Music.
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