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"Se o mundo vos odeia, sabei que, primeiro do que a vós outros, me odiou a mim." – Jo 15.18

28 de novembro de 2009

Fogueira das vaidades


Vaidade de vaidades, diz o Pregador; vaidade de vaidades, tudo é vaidade" Ec 1:2



A palavra vaidade é uma daquelas que levam as pessoas a incorrerem em equívocos. Pois embora relacionadas, o uso moderno e coloquial da palavra vaidade difere daquele usualmente utilizado nas Escrituras. Portanto, ao sermos perguntados sobre a vaidade, devemos ser cuidadosos quanto ao sentido em que o termo é utilizado. De maneira rudimenar, vou me referir a três "dimensões" do termo vaidade: vaidade espiritual, vaidade terrena e vaidade estética. É uma classificação ao gosto pessoal, sem rigor científico.

O significado de vaidade

Modernamente, vaidade pode ser definida como uma preocupação exagerada com a aparência, manifestada na maneira de se vestir, pentear e no uso de maquiagem e adornos. Porém, biblicamente, os termos hebraicos ('awen, shaw') e gregos (kenos, mataiotes) traduzidos por vaidade denotam mais uma ausência de conteúdo e inutilidade, ou seja, caracterizam aquilo que é vazio de significado ou que não atinge os objetivos. A relação entre o uso moderno do termo e seu sentido original fica por conta de que, em última análise, a preocupação em demasia com a aparência física é vã.

Vaidade espiritual

Resolvi chamar assim as tentativas do homem buscar refúgio nos ídolos. Assim, lemos "não vos desvieis; pois seguiríeis coisas vãs, que nada aproveitam e tampouco vos podem livrar, porque vaidade são" (1Sm 12:21). Davi reconhece que Deus aborrece "os que adoram ídolos vãos" (Sl 31:6), pois os ídolos "vaidade são, obra ridícula; no tempo do seu castigo, virão a perecer" (Jr 10:15). Além de um ídolo que "de si mesmo, nada é no mundo", os rituais religiosos também são inúteis. Aos que queriam oferecer-lhes sacrifícios um indignado Paulo diz "senhores, por que fazeis isto? Nós também somos homens como vós, sujeitos aos mesmos sentimentos, e vos anunciamos o evangelho para que destas coisas vãs vos convertais ao Deus vivo, que fez o céu, a terra, o mar e tudo o que há neles" (At 14:15). É vã (vaidade) qualquer tentativa do homem de satisfazer-se espiritualmente fora de Deus e sem a mediação de Jesus Cristo.

Vaidade terrena

Esta é a vaidade referida pelo Pregador. O termo aparece 28 vezes em Eclesiastes (ARA) e significa inutilidade. Porém, antes de assumirmos a posição extrema e existencialista do ponto vista de Salomão, devemos lembrar que ele escreve limitando o seu campo de pesquisa foi o que ocorre "debaixo do sol", ou seja, nada do que excede o tempo e o espaço foi considerado. Ele diz "apliquei o coração a esquadrinhar e a informar-me com sabedoria de tudo quanto sucede debaixo do céu" (Ec 1:13). Além disso, ele recorreu unicamente à sua inteligência para analisar os fatos observados, não tirando nenhuma conclusão que fosse além da razão. A conclusão a que se chega é que a busca pelo sentido da vida, sem recorrer a Deus e sem considerar a Sua revelação é pura futilidade, ou nas palavras do sábio, "vaidade e correr atrás do vento" (Ec 2:11). Sem a revelação de Deus e de seus propósitos a busca do conhecimento (Ec 1:12-18), de prazeres (Ec 2:1-11), de realizações (Ec 2:12-16), do trabalho (Ec 2:17-26) e das riquezas (Ec 5:8-6:2) leva à frustração extrema, pois Deus "pôs a eternidade no coração do homem, sem que este possa descobrir as obras que Deus fez desde o princípio até ao fim" (Ec 3:11). A menos que em algum ponto entre seu nascimento e morte Deus se revele ao homem, este entrará nesta vida por uma porta onde estará escrito "tudo é vaidade" (Ec 1:2) e sairá por outra onde também estará escrito "tudo é vaidade" (Ec 12:8).

Isto é assim porque a própria "criação está sujeita à vaidade, não voluntariamente, mas por causa daquele que a sujeitou" (Rm 8:20). Como parte da criação arruinada, o homem caído é, ele mesmo, destituído de sentido. "Somente vaidade são os homens plebeus; falsidade, os de fina estirpe; pesados em balança, eles juntos são mais leves que a vaidade" (Sl 62:9), conclui Davi. Assim, podemos dizer que tudo o que diz respeito à esta vida e a este mundo é vaidade, no sentido que carecem de sentido intrínseco e são incapaz de satisfazer o homem mesmo quando consideradas apenas as suas necessidades terrenas. Por isso Paulo ordenou "buscai as coisas lá do alto, onde Cristo vive, assentado à direita de Deus" (Cl 3:1), "pois a nossa pátria está nos céus, de onde também aguardamos o Salvador, o Senhor Jesus Cristo"(Fp 3:20).

Porém, veja só que interessante. Quando buscamos as coisas que são de cima, as coisas terrenas que antes eram vãs, passam a ter sentido e utilidade. O salmista disse "quem mais tenho eu no céu? Não há outro em quem eu me compraza na terra" (Sl 73:25) pois havia descoberto que a partir do momento que encontramos Deus, passamos a ter prazer na terra. Jesus também disse algo a respeito, quando orientou "buscai, pois, em primeiro lugar, o seu reino e a sua justiça, e todas estas coisas vos serão acrescentadas" (Mt 6:33). Há uma diferença enorme entre buscar sentido para nossa vida nas coisas terrenas, que são vaidades, e desfrutar dessas coisas com o sentido encontrado em Deus, pois descobrimos que "toda boa dádiva e todo dom perfeito são lá do alto, descendo do Pai das luzes" (Tg 1:17) e como"tudo que Deus criou é bom, e, recebido com ações de graças, nada é recusável" (1Tm 4:4).

Vaidade estética

A Escritura diz que "enganosa é a graça, e vã, a formosura, mas a mulher que teme ao SENHOR, essa será louvada" (Pv 31:30). Entendida em seu contexto, a palavra vaidade (ARC) significa que a beleza da mulher é inútil para ela ser reconhecida como virtuosa. Porém, não devemos nos apressar em coibir que a mulher apresente-se bela. Primeiro, porque formosura aqui está relacionada a beleza natural e não ao enfeitar-se apenas. E também porque a formosura em si não é vista de forma negativa nas Escrituras, basta uma leitura do livro dos Cânticos para nos convencer disso. Fiquemos apenas com a firmação bíblica de que a beleza não torna a mulher virtuosa, pelo contrário "como jóia de ouro em focinho de porco, assim é a mulher formosa que não tem discrição" (Pv 11:22).

Quanto ao cuidado com a aparência, parece-me isto é orientado pelas Escrituras, quando diz "em todo tempo sejam alvas as tuas vestes, e jamais falte o óleo sobre a tua cabeça" (Ec 9:8). O conselho de Noemi a Rute ainda parece atual "banha-te, e unge-te, e põe os teus melhores vestidos" (Rt 3:3) e Jesus condenou o andar molambento para aparentar religiosidade quando disse "tu, porém, quando jejuares, unge a cabeça e lava o rosto, com o fim de não parecer aos homens que jejuas" (Mt 6:17-18). Porém, especialmente se tratando de mulheres cristãs no culto, o bom senso é mandamento divino, pois "as mulheres, em traje decente, se ataviem com modéstia e bom senso, não com cabeleira frisada e com ouro, ou pérolas, ou vestuário dispendioso" (1Tm 2:9). Isto para que "não seja o adorno da esposa o que é exterior, como frisado de cabelos, adereços de ouro, aparato de vestuário; seja, porém, o homem interior do coração, unido ao incorruptível trajo de um espírito manso e tranqüilo, que é de grande valor diante de Deus" (1Pe 3:3-4). A verdadeira e real beleza não é obtida por vestidos caros e jóias caras, mas pela atitude do coração, pois "o coração alegre aformoseia o rosto, mas com a tristeza do coração o espírito se abate" (Pv 15:13).

Conclusão

A vaidade é condenável e se caracteriza por um vazio de significado e uma inutilidade de propósito. Dessa forma, a idolatria é a essência da vaidade. Da mesma forma, a busca por significado nas coisas terrenas é vaidade inútil. E preocupar-se exageradamente com a aparência pessoal pode constituir-se vaidade. Por outro lado, o prazer em Deus, o desfrute da criação com ações de graça e o cuidado pessoal são, além de desejáveis, mandamentos divinos.


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Fonte:  Cinco Solas

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